Foi uma batida entre dois carros em uma pista molhada. A situação do outro motorista é mais grave. Depois do atendimento, os dois são levados de ambulância para um hospital – não foi preciso usar o helicóptero.
BR-163, Mato Grosso do Sul. Um carro
ultrapassa em um trecho perigoso, obrigando o carro da equipe do
Fantástico a ir para o acostamento. Outro carro cruza a pista na estrada
movimentada.
São flagrantes de irresponsabilidade que
estão sendo monitorados naquele trecho da rodovia, inclusive pelo ar –
mas os motoristas não sabem disso. Como o de um carro branco, que
ultrapassa um caminhão quando outro vem no sentido contrário.
Já o motorista de uma caminhonete também
se arrisca e coloca vidas em risco. Ele passa por três veículos em um
trecho de faixa contínua, que indica ultrapassagem proibida. Ele comete
mais uma irregularidade, passando por um caminhão em local não
permitido. Só que a infração está sendo monitorada pela Polícia
Rodoviária Federal em uma operação especial que também usa helicóptero
para flagrar maus motoristas nas estradas federais.
A operação faz parte de uma pesquisa
inédita no país. O objetivo é avaliar o comportamento do motorista
brasileiro. Depois de parar o carro e dar orientações de segurança, a
Polícia Rodoviária monitora como ele vai dirigir ao longo dos próximos
20 quilômetros.
A operação ainda é uma experiência e
está sendo feita somente em trechos da BR-163, no Mato Grosso do Sul.
Primeiro, um motorista é parado ao acaso em uma blitz da Polícia
Rodoviária Federal. Os documentos são verificados e ele recebe
recomendações de segurança. Em seguida, é liberado.
O motorista segue viagem. Logo atrás vai
um policial, em um carro sem identificação da Polícia Rodoviária, que
leva também a equipe do Fantástico. Em pouco tempo, o motorista comete a
primeira irregularidade.
“Em menos de cinco quilômetros ele já fez uma ultrapassagem em faixa contínua”, diz o policial.
Pelo rádio, a descrição do carro é
passada aos policiais que estão no próximo posto da polícia, junto com a
orientação para ser parado.
O carro é parado no posto, e o motorista é confrontado pelo policial.
Policial: Você foi parado ali atrás pela Polícia Rodoviária Federal?
Motorista: Já fui parado hoje, sim.
Policial: Você cometeu alguma infração de lá para cá? Motorista: Não.
Policial: Só que eu tenho que informar que nossa equipe flagrou você cometendo ultrapassagens em local proibido.
Motorista: Eu não tinha visto. Não tinha reparado nisso.
O motorista da caminhonete também tinha recebido orientação da polícia.
“Não faça ultrapassagem em local proibido. Não exceda a velocidade da via e vai com Deus”, diz a policial.
Não adiantou nada. Ele é parado novamente e, como o outro motorista, nega ter cometido a infração.
Policial: Não ultrapassou na faixa contínua?
Motorista: Não.
Fantástico: Por que o senhor não seguiu a recomendação?
Motorista: Eu nem percebi.
Os dois motoristas vão perder sete pontos na carteira e pagar multa de R$ 190, mas podem recorrer.
Por sorte, durante a operação
acompanhada pelo Fantástico, nenhum motorista provocou um acidente. Em
2012, cerca de 8,6 mil pessoas morreram em acidentes nas estradas
federais.
No trânsito como um todo, são 43 mil
mortos por ano. São mortes que poderiam ser evitadas. Junto com os
feridos graves, levam sofrimento a milhares de pessoas e custam muito
caro ao país.
“Nós estimamos que a sociedade tem que arcar com um custo na ordem de R$ 40 bilhões por ano”, aponta Carlos Henrique de Carvalho, técnico do Ipea.
O cálculo
faz parte de um estudo chamado Custos de Acidente de Trânsito no
Brasil, feito pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, o Ipea, um
órgão do Governo Federal.
“O principal de componente de custo
desses acidentes de trânsito é a perda de produção, ou seja, quando a
pessoa, no auge da sua vida profissional, perde a vida ou vem a sofrer
uma lesão permanente”, explica o técnico.
O serviço aeromédico é uma parceria que
existe há sete anos entre o Samu e a Polícia Rodoviária Federal.
Funciona em apenas quatro cidades. Cada uma faz cerca de cem
atendimentos por mês. O custo de cada atendimento é de R$ 5 mil por
hora, pagos pelo contribuinte. As internações por acidente custam ao
Ministério da Saúde mais de R$ 200 milhões.
Em 2002, o Brasil tinha 33 mil pessoas com invalidez permanente por causa do trânsito. Em 2012, eram 352 mil.
“O custo social é muito grande, e a
gente precisa realmente trabalhar para que a gente possa diminuir isso”,
afirma Maria Alice Nascimento Souza, diretora-geral da PRF.
Lucas, de 19 anos, é um desses
pensionistas. Foi atropelado há nove anos quando saía da escola. Teve
traumatismo craniano e perdeu os movimentos do lado direito do corpo.
“Ele não falava, ele não sorria, ele não
comia, ele simplesmente mexia o olho para o lado esquerdo e para o lado
direito”, conta a mãe de Lucas, Elisângela Teles.
Ele vem se tratando em uma clínica
especializada em Goiânia com despesas pagas pelo governo. Anda com
dificuldade e não tem força no braço direito. Não consegue emprego. E
conta com uma pensão de R$ 678 por mês paga pelo INSS.
A mãe de Lucas diz que a motorista
causadora do acidente nunca ofereceu ajuda: “Ninguém atropela porque
quer. Mas a questão de ser humano, de ser solidário, isso é uma questão
de querer. E ela não foi, ela nunca ligou nem para saber se tinha
sobrevivido ao acidente”.
Para diminuir as despesas com acidentes e
fazer o motorista pensar duas vezes antes de colocar vidas em risco, o
INSS firmou um acordo com a Polícia Rodoviária Federal.
“Eu acredito muito no efeito pedagógico
da dor no bolso. Então se as pessoas pagam pelos seus erros, outras
pessoas também vão entender que, se cometerem delito semelhante, vão
também pagar o mesmo preço”, ressalta o presidente do INSS, Lindolfo
Neto de Oliveira Sales.
A Polícia Federal põe à disposição do
INSS todos os registros sobre acidentes em estradas federais. O causador
do acidente que levar a morte ou invalidez vai ser processado e, se
condenado, o INSS vai cobrar dele a pensão da vítima ou da família da
vítima.
Em 2011, em Natal, Andson Alves da Silva
dirigia embriagado e sem habilitação, quando perdeu o controle do carro
e atingiu o veículo de uma funerária. O motorista José Nilson Xavier,
de 30 anos, morreu na hora. Deixou a mulher e um filho de 10 anos.
“Destruiu minha família. Fica uma saudade, uma falta”, conta a viúva, Maria Alcina.
Dona Maria Alcina e o filho do casal recebem, por mês, R$ 820 de pensão do INSS.
O caso de Natal é o único do país onde
já houve sentença condenatória, em duas instâncias. A Justiça já decidiu
que Andson terá que ressarcir o INSS pela pensão paga à família da
vítima. O valor passa de R$ 500 mil. Ainda cabe recurso.
O cálculo levou em conta a expectativa
de vida da viúva, que é quem recebe o benefício. Dona Maria Alcina
Ferreira da Silva tem 34 anos. Hoje, a expectativa de vida da mulher
brasileira é de 78 anos de idade.
Procuramos Andson em Currais Novos, cidade onde mora, no interior do Rio Grande do Norte.
Por telefone, falamos com ele, que não quis comentar a decisão da Justiça. “Nunca tive a intenção de sofrer um acidente, nem de perder o controle do carro. É uma coisa que me traz muito sofrimento, falar sobre o acidente”, disse.
Fantástico: E se o motorista infrator não tiver condições financeiras para pagar essa dívida?
Lindolfo Neto de Olvieira, presidente do INSS: Ele vai ter o seu nome inscrito nos órgãos de controle de crédito, ele vai ficar impedido de comprar a crédito na praça, ele vai ficar inclusive impedido de exercer alguns cargos públicos até que quite seu débito.
“Eu vejo como uma medida muito boa,
salutar. Sob o ponto de vista jurídico, é perfeitamente possível. Quem
sofre danos, doloso ou culposo de terceiros, tem direito buscar
reparação pelo que pagou pelo ato desse terceiro”, avalia o ex-ministro
do STF Carlos Velloso.
Fonte: Globo.com
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